Não sei para você, mas a essência de viajar para mim está nas histórias que temos para contar. Diria que são como cicatrizes do bem, linhas que marcam na memória e ajudam a escrever um livro sobre outras culturas e povos. Mas nem sempre tudo é glamour, qual o bom viajante que não acumula alguns perrengues de viagem para contar?

Às vezes, quando viajamos e estamos fora de casa por muito tempo, temos aquela tendência de baixar a guarda. Naturalmente passamos a prestar menos atenção, seguirmos o fluxo e, quando menos percebemos, entramos numa furada.

Este texto é sobre alguns perrengues e algumas gafes que acumulei ao longo dos anos viajando. Não é sobre ensinamentos (pensando bem, pode até ser), mas é muito mais só para rir comigo mesmo e pensar: como é possível?

Alarme de incêndio e hotel evacuado

O ano era 2022 e decidi fazer uma viagem especial para celebrar o aniversário da minha esposa. O destino escolhido foi Malta e, por um momento, pensei que aquela celebração terminaria numa tragédia.

Depois de um dia inteiro de passeios pela cidade e algumas horas na praia, retornamos ao hotel e fui tomar banho. Foi um daqueles banhos longos e revigorantes, que só quem gasta a sola do sapato caminhando quilômetros quando viaja sabe o quão bom é.

Me lembro como se fosse hoje. O banho foi escaldante, daqueles que o banheiro parece que vira uma sauna com o vapor. Esqueci a toalha. Saí do box, abri a porta do banheiro e fui pegar a toalha em cima da cama. Daí para frente foi uma questão de alguns segundos: o alarme de incêndio do hotel disparou. O barulho era ensurdecedor e não deixava margens para dúvida: o hotel estava pegando fogo.

Em situações de perigo como essas, o instinto de sobrevivência fala mais alto. Ainda molhado, peguei a primeira roupa que vi, vesti e desci as escadas junto da minha esposa. Todo o hotel estava na mesma situação. Famílias de pijama, pessoas sem camisa, descalços, hóspedes atordoados e sem compreender o que estava acontecendo.

Vista da Baia de St Julian, com prédios modernos ao fundo
St. Julian é uma famosa região boêmia de Malta, com prédios mais novos. Foto: Paulo Mangerotti

O hotel estava localizado na região de St Julian’s, a mais boêmia de Malta. Éramos três dezenas de hóspedes fora do hotel, todos olhando entre si para tentar entender a situação. Aparentemente, do lado de fora, o hotel não pegava fogo, mas o alarme não parava e não tinha nenhum responsável na recepção – estava mais para um aparthotel, em que só havia funcionários no período da manhã.

Toda essa confusão, imagino, durou em torno de 1 hora. A situação só foi resolvida quando alguém ligou para os responsáveis, que chegaram lá na maior tranquilidade para desligar o alarme de incêndio. Não foram os bombeiros, sabe por quê? Porque não houve incêndio: foi o vapor da água do meu banho que causou todo o problema. Que situação!

Hotel reservado para o mês errado

Quem nunca se confundiu na data de reserva de uma hospedagem? A minha foi em Split, na Croácia.

Estava em uma viagem de duas semanas pelos Bálcãs e Split era meu último destino. Até então, tudo perfeito no mochilão, erro zero passando por Albânia, Montenegro e Bósnia e Herzegovina, mas tinha que acontecer um vacilo.

Já estava no meu último dia em Mostar, na Bósnia, procurei a host da minha hospedagem em Split para entender sobre o transfer que ela oferecia para o aeroporto. Conversa vai, conversa vem, a senhora muito educada disse que sem problemas, que o transfer estava incluído e que eu não precisava me preocupar, só pediu que enviasse a data e horário do voo. Foi aí que ela mesma me alertou: como você quer o transfer para o aeroporto daqui a dois dias, sendo que sua reserva é só para o próximo mês?

Incrédulo, voltei no Booking, olhei minhas reservas e, de fato, o erro foi meu. Reservei a mesma data, mas para o mês seguinte. Já estava tudo pago, inclusive.

A sorte nessa situação é que o suporte do Booking e da própria hospedagem foram ágeis e compreensivos. O mesmo quarto que reservei estava disponível na data que eu realmente precisava, então dentro da plataforma consegui solucionar o problema. Ufa!

Amantes de filas (só que não)

Dizem que brasileiro não pode ver uma fila que já quer entrar. Não recomendo. Ou melhor, recomendo certificar para onde é a fila antes de ficar tempo nela à toa.

O ano era 2021 e estava em viagem pelo leste europeu. O ponto de partida foi Viena, na Áustria, e de lá seguimos para Eslováquia, Hungria e República Tcheca. A grande gafe, porém, aconteceu mesmo no comecinho da viagem.

Pelo ano, você já deve ter situado que falo em contexto de pandemia. Na Europa as coisas já caminhavam mais tranquilamente na altura da viagem, a vacinação avançava e as medidas protetivas também. Foi justamente na época de abertura para o turismo esta viagem.

Avenida larga e prédio monumental em Viena
Em Viena tudo é monumental, não estranhe um prédio qualquer parecer um palácio. Foto: Paulo Mangerotti

Pois bem, lá estávamos eu e minha esposa felizes pelo centro de Viena, caminhando sem rumo como sempre gostamos de fazer. Passamos por um edifício monumental e vimos uma fila enorme para entrar. Longo pensei: “deve ser um museu, e pela fila hoje deve ser de graça”. Um disclaimer importante é que Viena está, sem dúvidas, entre as cidades mais caras que já conheci, portanto, iria cair muito bem conhecer algum monumento sem custos.

Como estratégia usual, deixei minha esposa na fila e segui em frente para ver, afinal, o tamanho da fila e do que se tratava o museu. Quando consegui entender onde estávamos entrando era, simplesmente, um ponto de vacinação contra a Covid-19 na cidade.

Em minha defesa, não se tratava de um hospital, mas mesmo de um desses edifícios de campanha temporária para abranger a maior parte da população. Enfim, deu até vergonha de contar!

Sem gasolina no meio do nada

Ainda sobre os tempos de pandemia, mas um ano antes, em 2021, decidi fazer uma viagem de aniversário para fora da cidade para respirar ar puro e limpar a cabeça. O destino escolhido foi o Parque Nacional Peneda-Gerês, que inclusive já mencionei em um artigo anterior sobre as belíssimas cachoeiras que tem.

Para ir ao Gerês e aproveitar melhor a viagem, recomendo alugar um carro. Os ônibus até podem chegar em algumas cidades da região, mas o carro sempre é necessário para chegar nas trilhas que dão acesso às cachoeiras ou para conhecer as pitorescas aldeias portuguesas, que no Brasil estão mais próximas de algo como “vilarejos”.

Uma das aldeias que escolhemos visitar foi Lindoso, no extremo norte do país, a poucos quilômetros da Espanha. Existem várias aldeias no parque, um dia posso escrever um artigo somente sobre as aldeias, porque são lindas e vale muito a pena a visita. Mas estamos aqui para o perrengue, então vamos direto ao ponto.

Vista do castelo de Lindoso e os espigueiros, mulher caminhando
A aldeia de Lindoso é famosa pelos espigueiros, antigos depósitos de grãos, ao fundo o Castelo. Foto: Paulo Mangerotti

Na região do Parque, os pontos de interesse ficam todos mais ou menos num raio de 100km. No retorno de Lindoso, última aldeia do dia, percebi que o carro começava a ficar sem gasolina. Você pode até imaginar que não seria grande problema, porque em 40km até onde estávamos hospedados havia de aparecer um posto de gasolina, certo? Não exatamente. O posto de gasolina mais próximo era na Espanha, mas as fronteiras entre os países estavam fechadas em razão da pandemia.

Sem solução aparente, o jeito foi dirigir e torcer para algum posto de gasolina que não existia no mapa surgir pelo caminho. A gasolina chegou a ficar na reserva e já nos preparávamos emocionalmente para o pior, mas para nosso alívio, 25km depois, surgiu um posto e não ficamos a pé. Essa foi por pouco e, desde então, nunca mais fui desprecavido quanto ao combustível.

Pronto, agora que já compartilhei quatro dos grandes perrengues que passei nas minhas viagens e espero que você tenha rido um bocado, gostaria também de me divertir. Me conta qual foi sua grande gafe de viagem, ou aquele perrengue que você sempre conta para os amigos. Até a próxima!